Fim de semana no Douro. Que bonito, que descanso. Sentirmo-nos quase em casa, saberem o nosso nome, guardarem o "quartinho verde" porque da outra vez gostámos mais, uma piscina para nós , um outro casal com dois filhos pequenos e outros dois casais ingleses sem filhos. Cheiro a fruta, passarinhos a cantar... o pacote todo!
E por falar em pacote... Hora do check-out:
- Querem aproveitar a nossa promoção para as vindimas, até 13 de Outubro! Temos um pacote muito bom que inclui visitas a à quinta e a outras aqui vizinhas, que não temos dimensão suficiente, onde podem participar na vindima, pisar a uva em lagares tradicionais, muito bom, mesmo.
- Não, muito obrigado.
- Está com um preço muito bom e estamos quase cheios.
- Então e pagam quanto? É à hora ou ao dia?
O ar aflito da menina, só visto!
- Pagamos quanto?!
- Sim, pagam alguma coisa ou oferecem a estadia e alimentação em troca do trabalho?
- Nós não pagamos... E a promoção é muito boa, tem os mesmos preços da época alta, nem paga suplemento pela vindima nem nada.
- Não, muito obrigado, mas se conhecermos alguém interessado recomendamos...
- Espero que tenham apreciado a estadia, uma boa viagem e até à próxima visita.
- Voltamos sempre, sabe que sim.
Quem me conhece sabe que adoro turismo rural, o contacto com a natureza, o descanso que nos proporciona, mas tenho a ideia que é preciso ser-se um bocadinho deslumbrado para embarcar nesses pacotes das vindimas... Pelo que vejo na televisão, sim, todos os anos, a partir de finais de Setembro lá levamos com as reportagens dos turistas eufóricos que cortam três cachos de uvas e se enfiam os pés no lagar a dizer que sim, que é uma experiência única, que adoram, só pode ser mesmo uma experiência única, se fizessem disso vida não falariam assim.
Lamento, mas vindimas não são isso. Não é chegar de jeep, por volta das 10 da manhã, cortar meia dúzia de cachos, esperar que o jeep vos apanhe e devolva à quinta para um almoço com tudo a que dá direito, uma sesta para recuperar forças e uma visita ao lagar mais pelo fim da tarde para pisar as uvas um bocadinho e voltar para um jantar delicioso.
Eu nuca vindimei a sério, mas vi vindimar. Eu era criança e também achava engraçado e pedia para andar ali no meio, cortava uns cachos e quando me fartava - ao fim de meia hora - vinha embora. Aquilo é duro, é trabalhar mesmo! É levantar de madrugada, rebentar as mãos e os braços a fazer força para cortar os cachos, é manter o mesmo ritmo o dia todo, que entretanto passa o tractor para despejar os cestos (é "alombar" com eles até ao tractor, que não chega a todos os lados), é levar ferroadas de abelhas e vespas escondidas nas parreiras, é comer do farnel que se levou, ou que trazem à hora de almoço, e voltar quase sem sentir os dedos... E ao fim do dia, quando o corpo já só pede cama, é enfiá-los no lagar e pisar as uvas. Ah mas eles cantam e dançam abraçados no lagar... Não, eles apoiam-se uns nos outros porque estão cansados. Cantam porque alguns foram matando a sede com o que tinham à mão, vinho... E, no outro dia, é voltar ao mesmo, de madrugada pelo dia fora, sem descanso, faça chuva ou faça sol. Para receberem quanto? Descontos? Isso é o quê?
Esta ideia romântica da vida no campo às vezes faz-me comichão... "Ah, se pudesse largava tudo e ia viver para o campo, viver sem horas e do que ele dá". Largavas pois, largavas a chorar ao fim da primeira semana. 'Tá bem abelha... dizes isso porque vives no conforto da cidade!
Adoro o campo, nas férias, ao fim de semana, mas a vida no campo é para homens e mulheres, vi cada uma, de barba rija! Gosto muito, sobretudo porque sei que volto à cidade.