O "mironismo", essa nobre actividade a que me dedico e que foi inspiração para o nome deste blog, abarca diversas especialidades.
A encabeçar a lista dos mirones, temos o clássico "voyeur", simples espectador que obtém prazer sexual através da observação de pessoas, aquele que encontramos de binóculos atrás de uma duna ou arbusto, a espreitar as meninas na praia, ou um casal de namorados no carro, atrás de uma cortina numa qualquer janela a espreitar a vizinha, num peep-show da Baixa.
Há, contudo, mirones que não procuram qualquer satisfação sexual, limitam-se a observar, gostam de ver e têm vida para isso, o mironus simplex. No fundo, são uns privilegiados, podem fazer aquilo de que realmente gostam. É frequente vermos este tipo de mirone agarrado à vedação de uma obra, a acompanhar com atenção os trabalhos de construção civil. Num outro palno, e com boa vontade, podemos englogar nesta categoria a sogra que, em silêncio e em modo assombração, vira sombra da nora na cozinha, por exemplo, só para se certificar de que ela usa todos os temperos na medida certa, tal como o seu filhinho adorado gosta (estas são para manter e estimar, são as sogras boas, as que observam em silêncio).
Segue-se uma variação mais complexa de mirones, os que acorrem aos cenários de tragédia, acidentes, incêndios, inundações, desabamentos de terras, cenários de crimes,enfim, se há uma tragédia, há, pelo menos, um mirone, nunca para ajudar, sobretudo e quase sempre para atrapalhar. Normalmente estes mirones são polivalentes, acumulam o "mironismo" com outra actividade bastante popular, o "palpitismo" ou "bitaitismo" (chamo-lhes mironus opinativus). Ainda mal chegaram ao local da tragédia já debitam verdadeiros tratados sobre o que aconteceu, como aconteceu e o que vai acontecer. Portanto, além de "bitaito-palpiteiros" são também videntes e juízes (mironus opinativus videntius iurisdictator), ninguém é tão rápido como um mirone a dizer de sua justiça, "foi um pneu que rebentou, de certezinha, e não trazia cinto!" ou, "era fazer-lhe o mesmo, prisão perpétua para essa gente, pena de morte já!".
Este mirone-palpiteiro-vidento-julgador esconde, na maioria das vezes, um exibicionista. É o mirone que não só gosta de ver, como gosta de ser visto. Se houver comunicação social por perto é certo encontrarmos este tipo de mirone a rondar o repórter. Uns limitam-se a dizer adeus para as câmaras (mironus-emplastrus). Outros, fazem questão de mostrar as suas capacidades de mironus opinativis videntus iurisdictator e fazem de tudo um pouco para chamar a atenção do repórter na ânsia de serem entrevistados e assim obterem a consagração de toda uma vida dedicada ao "mironismo", aparecer no telejornal!
E por falar em telejornal, hoje, enquanto via a reportagem sobre a descarga de esgotos no mar que levou à interdição de algumas praias em Quarteira, pude observar uma outra categoria de mirone, o mironus imbecilis. Aquele que sabendo que a descarga poluente é altamente lesiva para a saúde pública não hesita em levar a sua família, mulher e filhos pequenos, precisamente para a saída do esgoto em causa, nem que para isso tenha de transpôr as fitas que as autoridades colocaram a isolar o local, se as houver. Aparentemente as instruções das autoridades e o cheiro fétido (não estive lá mas acredito que cheirasse mesmo mal) não são suficientemente desmotivadoras. É preciso ver também, que isto de um mirone se fiar no que os outros dizem nunca foi boa política. Durante o Inverno e em dias de tempestades marítimas é frequente avistarmos o mironus imbecilis à beira mar, ignorando os conselhos da protecção civil, a certificar-se de que as vagas de seis metros que apareceram nas notícias têm mesmo os seis metros. São pequenas, não é? Ao longe não se vêem, tem de se estar ali mesmo debaixo da rebentação, nem que para isso seja necessário sacrificar a vida (a sua e a dos membros das patrulhas de resgate) e arriscar-se a ser levado por uma onda.
E tu Mirone, em que categoria te encaixas? Em nenhuma! Em todas! Sendo certo que não retiro qualquer prazer sexual da maior parte das coisas que vejo, que jamais me verão a correr para um cenário de tragédia para dar palpites (em frente às câmaras ou simpolesmente para quem está), ou com o nariz enfiado numa saída de um esgoto ou debaixo de vagas de 6 metros. Também faço o possível por não fazer julgamentos, ainda que este texto não passe disso mesmo, um enorme tratado de "palpito-julgamentismo" imbecil e tenha substituido as câmaras e microfones por este blog. Mironus confusus, será? Tenho as férias todas para pensar nisso... Ou não!