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segunda-feira, 1 de julho de 2013

Quase morri

Amigos leitores, folgo sabê-los por aí e é meu desejo, hoje mais do que nunca, encontrar-vos bem e de saúde.
Eu Mirone, ainda a tremer, estive hoje às portas das morte. Sim, vi o túnel negro, senti a alma a sobrevoar o meu corpo. Tivesse eu aderido aos telecines e até o filme da minha vida me teria passado pelos olhos. Não, não havia uma luz branca e apaziguadora, era a treva, a mais profunda das trevas e nada nem ninguém  poderia apaziguar-me, tal era o desespero. Ainda sinto calafrios. Felizmente fui forte, agarrei-me com todas as forças à vida, aos que cá deixava e que amo muito, e o "dlim dlão, senha A17, balcão 10" salvou-me a vida.
Deixem-me só respirar mais um pouco o ar fresco da noite. 
Pois bem, esta que vos escreve escolheu o dia de hoje, uma segunda-feira quente para visitar uma repartição pública (uma conservatória, fujam delas como o diabo da cruz, caros leitores, acreditem no que vos digo). Suponho que num número recente da Pro-teste a segunda feira de um dia de verão tenha sido classificada como a escolha acertada, a avaliar pela quantidade de pessoas, de todas as idades e etnias, que lá se encontravam.
Apesar do número manifestamente insuficiente de cadeiras face ao número de utentes do dito serviço, consegui um lugar sentado. Aparentemente, o intenso calor que se fazia sentir e a saturação do ar que se respirava, terá levado alguns utentes a esperar a sua vez do lado de fora da porta.
Alguns minutos depois, vaga uma cadeira à minha frente. Sinto alguém deslocar-se apressadamente o fundo da conservatória na direcção da cadeira vaga e ali se instala. Ao deslocar-se, o odor deixado no ar mostrava que sim, estava muito calor. Não me lembro de muito mais, só que tinha a pele escura como a noite, trazia roupas simples e largas (um vestido pelo joelho, sem mangas). Visivelmente cansada, sabe Deus quantas horas de limpezas teria no corpo àquela hora, quantos autocarros teria apanhado para ali chegar, deixa-se cair prostrada na cadeira. A quem trabalha tolera-se muito, e por isso culpei o seu cansaço pela pose desconcertante que tomou, sentada de pernas escancaradas, ali mesmo, virada para mim.
Por pudor baixei os olhos, concentrei-me nos documentos que trazia comigo. Tentei concentrar-me. A verdade é que um odor indescritível me faz levantar os olhos novamente. Ali estava ela, encalorada, de pernas abertas. O envelope de formato A4 que trazia consigo era agora um improvisado leque que abanava alternadamente na direcção do rosto, das axilas que erguia e do entrepernas, que escancarava.
Não me perderei em mais descrições, que ainda tremo. Hoje quase morri, hoje soube o que são as trevas...
Salvou-me o sistema informático, que naquele momento chamou o número da minha senha.

3 comentários:

  1. Caro mirone, não sendo especialista da saúde, devo aconselhá-lo a não frequentar transportes públicos, nomeadamente os das grandes áreas metropolitanas. Não se esqueça também de evitar a repartição de Segurança Social. Acredite, por razões imputáveis à actual conjuntura económico-financeiro-social do nosso muito amado país, consegue ser muito pior que qualquer conservatória. Muitos dizem ser mesmo a personificação do inferno na terra.
    ;)

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  2. Isso julgava eu, que as conservatórias eram o céu, quando comparadas com a Segurança Social ou as Finaças. Mas depois do que vi ontem, já não sei.

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