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quarta-feira, 3 de julho de 2013

Sair do armário (ou o dia em que deixei parte da dignidadde numa estação de serviço da A1)

Toda a gente teve na vida um momento de fraqueza a ensombrar uma relação perfeita, não digam que não. Todos passámos, pelo menos uma vez na vida, por uma prova de fogo. Toda a gente, de certeza. Simplesmente há quem na fraqueza consiga encontrar forças para não cair. Eu Mirone me confesso, já tive os meus momentos de fraqueza, mas há um que recordo com especial vergonha.
Corria o ano de 2000. Tinha acabado o curso há poucos meses e estava a fazer um complemento de formação obrigatória que implicava uma deslocação diária de cerca de 160 km, durante alguns meses. A opção mais lógica e economicamente mais sensata foi dividir boleias com um grupo de colegas, sendo que em cada semana um de nós levaria o seu carro suportando os respectivos custos (pareceu-nos mais prático do que estar a fazer diariamente as contas a combustíveis e portagens).
Inicialmente eramos cinco colegas. Depois houve um que desistiu  e duas que optaram por alugar um quarto e ficar durante toda a semana. Ao fim de dois meses eramos só nós os dois a fazer a dita viagem diária. Durante aqueles meses conversámos sobre tudo, desde os assuntos mais corriqueiros como cinema ou música (um dia  hei-de contar-vos como deixei a outra parte da minha dignidade no porta luvas de um Volkswagen Polo), aos mais profundos e íntimos desejos. Gostavamos verdadeiramente da companhia um do outro. E o que parecia ser uma relação de amizade pura, caminhou, não sei como nem quando para um flirt cada vez menos flirt (se é que me faço entender), ao ponto de me fazer pensar "Olá, mas o que é isto que temos aqui? Queres ver que o interesse é mútuo? Mirone, Mirone, tu não te desgraces. Tens um namoro de 6 anos. Imagina que era ao contrário, não ias gostar". Pensava, pensava, mas a verdade é que nunca passei dos pensamentos à acção. Até ao dia...
Pois é, o curso acabou e, naquela noite quente de Julho fizemos aquela que seria a nossa última viagem de regresso. Era a minha semana de levar o carro (impecavelmente limpo e aspirado, que uma pessoa gosta de impressionar sempre que pode).
Mal entrámos na auto-estrada sinto a sua mão na minha.
- Podemos parar na próxima estação de serviço? Tenho uma coisa muito importante para te dizer.
- Importante? (Calma Mirone, calma! Pode não ser nada disso.)
- Sim, muito importante. E como sei que provavelmente nunca mais nos vamos ver tenho mesmo de te dizer, senão rebento. Não tenho pensado noutra coisa nos últimos tempos, anda a consumir-me por dentro...
 "E eu a querer consumir-te por fora", pensei. " Mirone Mirone, onde te vais meter. Tira daí as ideias, ganha juízo, não deites tudo a perder".
 - Estes meses foram muito importantes para mim, nunca me senti tão à vontade com ninguém como me sinto contigo...
"Que se lixe, nunca mais nos vamos ver, ninguém vai saber, seja o que Deus quiser". Parei o carro, tirei o cinto e olhei-lhe nos olhos.
- Sabes Mirone, eu sei que para muitos isto é errado, mas eu não consigo mais fingir uma coisa quando o meu coração me diz outra.
"É agora Mirone, é agora, avança! Isto é como o outro cantava, tu estás livre e eu estou livre e há uma noite por passar". 
Acaricio-lhe o rosto, aproximo-me perigosamente da sua boca.
- Deixa-me dizer-te, senão perco a coragem.
- Não é preciso, já sei o que me queres dizer. Não estejas assim...
- Vou assumir-me! Sou gay. Pronto era isto.
Abraçamo-nos em silêncio. Ligo o carro. A estação de serviço fica para trás e com ela grande parte da minha dignidade.

8 comentários:

  1. Bem, é preciso coragem. Parabéns, mirone, por te confessares em público :P

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  2. A única confissão que aqui faço é que ponderei dar uma facada num namoro hetero-sexual, facada essa que nunca veio a acontecer porque a outra pessoa afinal era gay :P E disso, não me orgulho nada, confesso. parabéns por ter mau carácter? :P

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  3. Não, rapaz. Por partilhares este momento tão íntimo, pessoal e intenso :)

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  4. Há lá coisa mais intensa que avançarmos à campeão,convencidos que está no papo, para depois partirmos a boca toda contra a parede?

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    1. O sabor na vida está nas emoções fortes que nos proporciona inesperadamente. Frui-a :)

      (Esta saiu bem, porra!)

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  5. Mas também podemos daqui deduzir que a tua capacidade de analisares o comportamento de sedução feminino está muito em baixo, não?

    Brandie

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    1. Brandie, a minha capacidade para analisar o comportamento de sedução feminino, como é óbvio, é ZERO!

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