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segunda-feira, 9 de junho de 2014

Queres partilhar connosco o momento alto do teu dia, Mirone?

Com muito gosto o farei. É sempre importante assinalar o dia em que um ilustríssimo sexagenário com quem nos relacionamos por motivos profissionais, sisudo até à última potência, a quem nunca vimos um sorriso nos conta que em tempos idos, há cerca de 50 anos, foi bailarino da Alunos de Apolo.

- O senhor, nos Alunos de Apolo?! Desculpe mas nunca pensei que gostasse de danças de salão.
- E pensa bem, não gosto mesmo nada. Foi um castigo que o meu pai me deu, tudo por casmurrice minha, e que durou perto de dois anos dois anos. Acérrimo defensor da máxima mens sana in corpore sano, acreditava que a par das melhores notas do liceu, os seus filhos deveriam ter uma actividade física complementar.  Ora eu, que gostava mesmo era de estar fechado no quarto, agarrado aos clássicos ou a resolver problemas aritméticos como quem faz palavras cruzadas, sabedor que era de que o meu pai jamais aceitaria um não como resposta, pensei que o demoveria de tal intento se lhe dissesse que a única actividade física que me apaixonava eram as danças de salão, "mas sabia que o paizinho, um homem sério e conservador, jamais o autorizaria", disse-lhe na altura. Os meus irmãos faziam remo e natação e era suposto que também eu praticasse um desporto viril. Acontece que o paizinho sempre foi um homem brilhante e percebeu perfeitamente que aquela resposta não passava de um pretexto idiota, alinhavado em cima do joelho, para não ter de praticar desporto. "Não seja por isso, meu rapaz, amanhã mesmo te acompanharei à Alunos de Apolo, se é danças que queres aprender, pois que o faças com os melhores".

12 comentários:

  1. E lá andou ele, dançando o tango (quiçá uma milonga), de mão dada com o grande Luis Luzes: "such stuff as dreams are made on".

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    1. Eu diria que se tratou de um verdadeiro pesadelo para aquele a quem o temor reverencial não permitia dizer um não ao pai, muito menos dizer-lhe que não estava a falar a sério quando disse que queria aprender a dançar. Outros tempos... dos quais só terá ficado o sembante cisudo que ainda hoje carrega o ilustre catedrático.

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    2. Ficou zangado desde essa altura. Há pessoas assim.

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    3. Não é que seja uma pessoa zangada, é antes uma pessoa que nunca vi sorrir. É sempre muuito sério e formal, mas não o sinto zangado.

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    4. Não terá, por certo, sido pelas viagens ao Campo de Ourique enquanto jovem -- acredito que, nessa altura, não fosse desinteressante para um jovem ser devidamente aconchegado por umas robustas e rodopiantes divas (as mesmas que pululavam em torno de Luzes e seus companheiros apolíneos).

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    5. Não sei, sinceramente não sei. O senhor concentrou-se-se na carreira académica na àrea da engenharia, uma vida dedicada ao estudo e ensino, em Portugal e no estrangeiro... Acredito honestamente que apenas não gostasse de danças de salão, por muito interessante que pudesse ser o contacto com divas rodopiantes, como acredito que fosse um pé esquerdo, como costuma dizer-se, e que tenha avançado a proposta na esperança de que o pai lhe dissesse que não e assim escapasse à actividade física imposta. Para um homem que não saiba dançar, sem o menor sentido rítmico (o que não deixa de ser estranho estranho num amante da matemática), acredito que as aulas de dança fossem sobretudo fonte de desconforto e até alguma humilhação.

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    6. Talvez tivesse sido a relação com o pai, desde essa altura, por o ter feito aprender com o seu próprio erro infantil, que o tenha transformado nessa pessoa. Mas posso estar a divagar...

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    7. E eu sei lá, Uvinha. Só conheço o senhor por motivos profissionais e sei que está sempre muito sério. Sei lá se foi por causa do pai... Isto foi um desbafo que ele teve hoje a propóstito de uma pessoa do grupo que comentou que o importante é sabermos dançar consoante a música que nos dão.

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    8. E olha que nisso, digo eu, não está de todo errado. De todo...

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  2. Cara Mirone, por favor não publique este comentário, é apenas para lhe dizer que há um typo no texto: deveria estar escrito "sisudo". Boa noite=)

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  3. Sou o anónimo das 23:14, peço desculpa, nunca tinha comentado e não sabia que não tinha moderação de comentários=(

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  4. Não faz mal. Uiii, que vergonha. caramba, é mesmo grave - e não, não é gralha, repeti o erro várias vezes e repetiria até alguém me chamar à atenção. Olhei várias vezes para a palavra e não gostava do que via, mas não me ocorreu que pudesse ser um erro ortográfico. Porque é que não escrevi taciturno?
    Obrigada mesmo. Vou alterar (mas deixarei o seu comentário visível, que não tenho problemas em reconhecer erros)

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