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sábado, 3 de maio de 2014

Eu só queria aprender a pintar...

(Post de gosto muitíssimo duvidoso. Os mais enjoadinhos façam o favor de carregar na cruzinha do canto e seguir viagem. A culpa é da Loira).

A mim ninguém convida para  passar fins-de-semana num Hotel Concept Resort Fitness Wellness Beauty Trendy Luxury Relaxation Gourmet Boutique Eco Design & Spa, mas não é por isso que deixo de ter experiências agro-chic (eu acho que é mais choque, mas enfim, tudo pelo blogo-glamour), dizia eu experiências únicas e irrepetíveis (queira Deus pai todo poderoso que sim, que se mantenham únicas e irrepetíveis) e inolvidáveis para partilhar com os leitores. Experiências que nos fazem recuar no tempo, ao século passado. Oh, esperem, aconteceu mesmo no século passado, não houve nenhuma viagem no tempo.
Corria o ano mil novecentos e noventa e três da graça do Senhor, e esta que vos escreve frequentava o décimo segundo ano. Bom, nessa altura, havia apenas três disciplinas no décimo segundo ano. Mas tinhas chumbado, Mirone? Estavas a fazer melhoria de notas? Não, nada disso. No décimo segundo ano só havia três disciplinas, que a variavam consoante a área vocacional escolhida. Eu frequentava a área de humanísticas e, sobrando-me tempo com fartura e mantendo-se o "bichinho" das artes a morder-me os calcanhares, a minha mãe sugeriu que fizesse um cursinho de iniciação à pintura, umas aulas particulares, para ocupar o tempo. Tivesse feito um workshop e hoje estaria representada nos principais museus e galerias do mundo. Hélas, cada um é para o que nasce...
Sem a preciosa ajuda da internet, sim, naquele tempo a internet estava longe de ser o que é hoje, perguntámos aqui, perguntámos ali e assim cheguei às aulas de uma pintora conhecida de uma amiga da minha mãe. "Vais gostar dela, Mirone. É uma pessoa muito simples e acessível, muito terra-a-terra, não tem nada tiques de  vedeta nem frescuras de artista".
A senhora era uma figura ímpar e vivia num mundo muito seu, numa quintinha, em total comunhão com a natureza, rodeada de animais domésticos, uma pequena arca de Noé com galinhas, patos, coelhos, gatos, cães, periquitos e cultivando toda a espécie de legumes, era quase auto-suficiente. Entre os muitos animais, havia uma vaca leiteira que a senhora ordenhava diariamente e cujo leite transformava em queijo e manteiga. Um cenário supostamente idílico, para potenciar a minha veia criativa. Durante um mês teria aulas duas manhãs por semana e deveria acabar o mini-curso a dominar as técnicas básicas de pintura a óleo e acrílico. Adiante.
Talvez na segunda ou terceira aula, a vaquinha estava especialmente agitada. Mugia, mugia, não havia meio de se calar. A professora estava em constante vaivém entre o atelier e o estábulo. A certa altura entrou no atelier de forquilha um punho e entregou-me uns botins (as fashionistas agora chamam-lhe galochas). Workshop, galochas? Não, comigo tinha de ser mini-curso e botins. Oh atraso de vida, porque é que não havia blogs para me orientarem no caminho do glamour, porquê?. 
- Vem comigo, Mirone, é uma emergência! A já-não-me-recordo-o-nome-vou-chamar-lhe-Mimosa vai parir.
- Vai parir? E quer que eu a ajude? Eu? Mas eu não percebo nada de vacas, muito menos de partos.
- Tem de ser, já telefonei ao veterinário e ele está a vacinar gado em o-nome-de-uma-aldeola-que-também-não-me-lembro e não pode vir já.
- Mas não é perigoso?
- Não te preocupes, eu faço tudo. Só tens de puxar quando eu te disser. 
Dirigimo-nos ao estábulo. A bichinha estava em visível sofrimento, tinha a bolsa de águas pendurada, ainda intacta, mas já se viam as patinhas do bezerrinho. Eu estava em pânico, congelada, e repetia para dentro "isto não está acontecer, isto não está a acontecer, isto não está a acontecer".
-Afasta-te, vou romper-lhe o saco.
"Isto não está a acontecer, ela não está às forquilhadas à bolsa como um garoto mexicano à paulada a uma piñata ".
Splash!
"Isto não está a acontecer, eu não fiquei com a roupa toda salpicada, eu não fiquei com a roupa toda salpicada".
Entretanto o bezerrinho já tinha as patinhas todas de fora e já se via a ponta do focinho. Fiquei a saber que eles nascem numa posição semelhante à de um nadador quando mergulha para a piscina. E a vaca estava de pé, sempre pensei que parissem deitadas.
- Agarra numa pata que eu agarro noutra Mirone. Agora é que é perigoso, se ficar entalado pelo pescoço.
- Mas eu não tenho luvas.
- Não te preocupes, as tuas mãos estão suficientemente limpas, não é preciso desinfectar.
"Pois estão, e eu queria muito que continuassem assim".
- Puxa, Mirone, puxa!
E eu, que remédio, puxei. A bezerrinha - era menina - nasceu forte e saudável. Não sei qual das duas tinha mais dificuldade em manter-se de pé, se ela se eu. Agradeci a todos os santinhos o facto de a vontade de ser veterinária se ter perdido por volta dos seis anos, quando decidi que queria ser cabeleireira, professora e dona de café, um três-em-um..

E o mini-curso foi útil, Mirone? 
Penso que sim, apesar de nunca mais lá ter voltado. Pelo menos se mais alguma vez me cruzar com uma vaca leiteira em trabalho de parto, já posso dizer que tenho experiência. Foi num mini-curso que aprendi. Se fosse hoje seria um workshop e estaria de galochas, portanto acho que me posso considerar aprovada com distinção.






7 comentários:

  1. Acho que o Zona Saloia não vai conseguir tanto...

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    1. Eu tenho praticamente a certeza!
      Presentemente, penso que sou a única blogger que pode dizer que já fez o parto de uma vaca com as suas próprias mãos. Tudo o que vier depois será mimetismo fruto da mais pura inveja e ressabiamento.

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    2. :DDDDDD
      Vocês não podem ver nada! Uma pessoa vem para o campo e é ver-vos a sacar de todas as vossas experiências agrícolas! Pffffff... Invejosas! :DDDD

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    3. A questão que se impõe é: e tu, Palmier, já fizeste nascer uma bezerra "with your own bare hands"?
      Não, pois, não? Acho que estamos conversadas no que diz respeito a invejas...
      :DDDDDDDDDDDDDD

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  2. Mirone, um dia destes vou dar com uma vaca em trabalho de parto no meio do monte e sabes o que vai acontecer? Vais ter que me dar todas as indicações técnicas para eu fazer nascer o bezerrinho. E sabes uma coisa? Depois levo-o para casa, coloco-lhe uns laços e umas rendas e transformo o meu bike blog em fashion blog. E depois sim, vai ser sucesso garantido, afinal o que me falta é só isso, um animal de estimação,

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  3. Eu já fiz um parto a uma cadela. Mas a uma vaca é obra. Ninguém bate isto...

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    1. A experiência foi de tal forma marcante que decidi que bichinhos, só os macaquinhos que tenho no sótão (ou os peixinhos dourados que vão passando pelo quarto da Mironinho. Sou uma mariquinhas do pior...
      Estranhamente, lembro-me de em pequena querer ser veterinária e criadora de cavalos.

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