Há dias em que sou burra e há dias em que sou muito burra. Depois há aqueles em que se houvesse um prémio mundial da burrice ele era meu, com larga vantagem sobre a concorrência. Aqui "há atrasado" foi o dia!
O trabalho corria bem, sem grandes precalços, sem pontas penduradas, tudo despachado a horas decentes.
Cinco da tarde. Entro em modo "ultra-eficiente". Se for rápida ainda apanho a seguradora aberta para entregar as despesas de saúde e pedir o reembolso.
Viva, estacionamento à porta! "Bahhh, está a chuviscar, o parquímetro fica ao fundo da rua, demoro mais tempo a ir pôr a moeda do que a entregar os documentos. Só tenho moedas de um euro ou de um e dois cêntimos, não vou pôr um euro por causa de um minuto, vá, dois, três no máximo, se me demorar". Olho à minha volta. Nem sinais de polícia. É só um minutinho, arrisco.
Não foi só um minutinho, também não foram dois, nem três, foram quase quinze. Ainda fui a tempo de dar com o "xôr" agente a levantar delicadamente a escova limpa-pára-brisas e deixar o talão.
- Senhor agente, mas foi só um instantezinho para vir aqui à seguradora.
- Sim, imaginei que sim, é sempre só um instante, mas agora já está, passe na esquadra nos próximos 10 dias, não se esqueça.
É bem feito, para não pensares que és mais que as outras! Parece que o dinheiro não te custa a ganhar, deves pensar que nasce nas árvores. Burra, Mirone! Burra!
Rabinho entre as pernas, retomei o modo "Mirone ultra-eficiente", pensava eu. Cinco e vinte e já estou à porta da escola. Tenho lugar imediatamente antes da passadeira, que sorte. Deixa cá ver, trinta segundos para atravessar a passadeira, trinta segundos para ma entregarem, vestir casaco, voltar ao carro, outros trinta, dois minutos para fazer os quinhentos metros que separam a escola de casa e, finalmente, lar, doce lar! Antes das cinco e meia, tal como previsto. Tudo "nos conformes". És a maior Mirone!
Saio apressada, atravesso a estrada, recolho a Mironinho, atravesso a estrada, abro o carro, sento a miúda, ponho-lhe o cinto, dou a volta ao carro, abro a minha porta, ponho o pé direito dentro do carro....
...e deixo cair a chave. (nota: não uso porta-chaves na chave do carro).
Espreito para dentro do carro. Não vejo a chave. Deviam fazer chaves fluorescentes, que se vissem bem no chão do carro. Puxo o banco para trás. Depois para a frente. Nada de chave. Se calhar caiu para a rua. Abro a porta com jeitinho, há carros a passar mesmo ao lado. Saio do carro. Olho à volta. Do mal o menos, não há sarjetas por perto. Baixo-me. O chão está molhado. Procuro debaixo de carro, à frente, atrás, dos lados, na estrada. Da chave, nada. Volto a entrar no carro. Levanto tapetes, encontro uma moeda de 50 cêntimos (agora, estuporada?!). Procuro no espaço entre o banco e os apoios do cinto de segurança. É impossível que tenha entrado para ali, mas nunca se sabe. Saio do carro outra vez. Há um carro que passa e apita. Volto a baixar-me, espreito debaixo do carro. Nada!
- Porque é que estamos aqui mãe? Porque é que não vamos para casa?
- Agora não Mironinho, que a mãe perdeu a chave, agora não.
- Podemos ir a pé. É já ali a seguir àquele prédio, até dá para ver.
- Agora não.
Começo a ficar nervosa. E o carro parado antes da passadeira. Passa outro carro que apita. Está a ficar escuro e continua a choviscar. Apetece-me chorar. Onde é que se meteu a chave? Pára um carro branco atrás de mim. É a polícia. Era mesmo o que eu precisava. Largo num pranto. Duas multas no mesmo dia, em menos de uma hora! Ninguém merece!
O polícia deve ter ficado sensibilizado com as minhas lágrimas.
- Boa tarde, precisa de ajuda?
- Preciso. Buáaaaaaaa!!!!!!!!!!!!!!!!
- Acalme-se, minha senhora. O que é que se passa?
- Deixei cair a chave do carro quando estava a entrar e não a encontro e tive uma multa de estacionamento há meia hora e agora vou ter outra. Buáaaaaaaa!!!!!!!!!!!!!
- Mas viu bem dentro do carro?
- Vi, já tirei tapetes e tudo. Buáaaaaaaaaaaaaa!!!!!!!!!!!
- Dá-me licença que a ajude?
- Dou, claro que dou! Buáaaa!
O polícia abre a porta do carro, escancarada, e dá com a chave no mesmo instante. Estava no lugar mais improvável de todos, no estribo do carro, bem no fundo, junto às dobradiças da porta. Claro que nunca a encontraria, nunca me lembraria de escancarar a porta com outros carros a passar.
- Pronto, já tem a chave. Agora acalme-se e boa viagem.
Nesse dia tive medo de entrar na cozinha e preparar o jantar. Não tinha apanhado a segunda multa, é certo, mas tanta estupidez junta dizia-me que era prudente não abusar da sorte.
Eu encomendava pizza... e mandava o marido abrir a porta ao Pizzaman...
ResponderEliminarImpugna mas é a multa, que isso acaba por prescrever! Posso recomendar-te uma advogada bem catita!!! ;)
ResponderEliminarTenho uma espécie de objecção de consciência... No fundo sei que foi merecida. Tinha consciência da ilicitude os meus actos e previ o resultado (aquilo de não me conformar com ele, "ah, não vai aparecer um polícia para me multar", foi mesmo para me enganar, a esquadra fica a dois passos, na verdade sabia que ia acontecer). E enquanto me lembrar dos 30 euros não repito a gracinha.
EliminarPor essa ordem de ideias tinhas implorado ao segundo polícia que te passasse a segunda multa... pois que merecias, merecias!!! ;)
EliminarEu disse que era burra, não disse que era masoquista. :)
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