Por outro lado, há ainda alguns professores exigentes, que marcam
faltas de material se, na segunda semana de aulas, os alunos não
trouxerem tudo o que lhes foi recomendado, ou rejeitando o livro do ano
anterior porque a página 20 passou a ser a 24.
Pondo de parte o transferidor e a régua, gostava de vos transmitir
algumas das minhas “ansiedades” quanto aos manuais escolares. Tenho três
filhos no 3º ciclo e, nesta época do ano fiquei mais uma vez perplexo
e, devo dizer, irritado e sentindo-me, passe a expressão coloquial,
“embarretado”.
Ao encomendar os livros, deparei-me com várias questões, que passo a
expor, quanto mais não seja para partilhar as minhas “angústias”.
Para dar um exemplo: fazendo as contas, os manuais e respetivos
apêndices, para o 7º ano, incluindo uma língua estrangeira para lá do
inglês, ficam (com desconto de utilizador frequente) pela módica quantia
de 396€. Trezentos e noventa e seis euros. Se considerarmos que
frequentam o 7º ano cerca de 123.000 alunos, temos um total de 48
milhões de euros. Só para o 7º ano! E há doze anos de escolaridade
obrigatória! Os leitores façam as contas e vejam o resultado.
Se decidirem editar um livro a cores, em formato A4, e com o mesmo
número de páginas, com capa plastificada, brilhante a cores, terão de
desembolsar apenas metade já incluindo o IVA. Todavia, se a Imprensa
Nacional/Casa da Moeda, que é a “tipografia” oficial do Estado
português, fizer essa edição, como o faz para o Boletim de Saúde
Infantil e Juvenil, o Diário da República, os Livros de Reclamações que
existem em todos os estabelecimentos ou até o Livro de Registos de
Lições de Teoria de Condução, o custo será muitíssimo menor e sem IVA,
estando a priori assegurada a sua distribuição através do Ministério da
Educação.
E agora umas perguntinhas: qual a razão porque o Ministério, que
(creio…) é o responsável pelas linhas gerais da política educativa, não
cria um grupo de trabalho para cada disciplina (e que os profissionais
que o integrem sejam bem pagos) e esses peritos encarregues de elaborar
manuais para os estudantes de todo o país. O ensino será assim tão
diferente para um aluno de Braga relativamente a um de Faro, Famalicão
ou Leiria? A matemática muda de norte para sul? Ou a história de
Portugal?
Por outro lado, ao querer aproveitar os livros do meu filho que está
no 8º ano para um dos que está no 7º, deparei-me com o facto de ser
muito difícil apagar o que ficou do ano passado, mesmo escrito a lápis.
Ah! E ao pretender comprar apenas o caderno de atividades (que é o que
está inutilizado), constatei que a editora só vende em bloco as duas
coisas: manual e caderno. Depois, pequenas mudanças de paginação
inutilizam, pelo menos para alguns “s’tores”, o uso do manual do ano
anterior. Mais: os manuais mudam conforme o vento e este ano até pode
ser outro.
Resumindo, leitores. Porque não manuais de um grupo conceituado de
autores, pagos pelo Estado, que durem para vários anos (D. Afonso
Henriques deixa de ser o primeiro rei de Portugal ou a capital de França
vai ser Nice, para o ano que vem? Arquimedes já não dirá “Eureka”
quando olhar para o sabonete da banheira?) e produzidos e distribuídos
pela Imprensa Nacional/Casa da Moeda.
Aqui estão algumas das minhas perplexidades. Este ano foram cerca de
1.200€ só em manuais… eu posso, mas há muitos que não podem. E mesmo
podendo irrita-me ser explorado, encostado à parede e esmifrado por
pessoas gananciosas, com o apadrinhamento do governo do meu país, dentro
do quadro de uma escolaridade que é obrigatória e um dos maiores
investimentos que se pode fazer para avanços civilizacionais.
Ah, a beleza das "editoras" e seus manuais de/para "financiamento". A beleza do ME! ...
ResponderEliminarMirone, Ninguém quer saber disso para nada. Quando muito, a culpa é dos "s´tores"...
E eu? Não conto?
EliminarCara Mirone, percebo onde quer chegar o cronista (e até concordo com a sugestão da organização de manuais não-comerciais). Contudo, há um facto que me irrita bastante em Portugal e nos portugueses: toda as pessoas parecem ser especialistas em educação, sabendo sempre muito bem o que faz ou o que deve fazer um professor, a avaliar pelos «palpites» que chegam de todo o lado e a toda a hora (mesmo pela boca de pessoas das quais seriam expectável exigir um pouco mais de sensatez). Não me parece que se questione tanto outras profissões mas, provavelmente, será só impressão minha.
ResponderEliminarAinda assim, o cronista citado não deveria falar do que não sabe. Por exemplo, o facto de alguns manuais adotados no ano passado (o de Português do 8.º ano, por exemplo) não servirem para este ano deve-se unicamente ao Ministério da Educação que publicou, num ano, os novos programas (com as editoras a produzirem novos manuais) e, no ano seguinte, as metas curriculares que «explicavam» o novo programa e que iam além dele, em muitos casos, colocando automaticamente, os manuais publicados no ano anterior na lista dos «desatualizados». E, não, não é por causa de diferenças na paginação que algum professor exige um livro novo, como é óbvio. No manual do ano que referi há dezenas de páginas com textos novos. E a maioria dos manuais, ao contrário do que é afirmado na crónica citada, vende os livros auxiliares à parte. Além disso, é estranho o cronista, como pai, ignore o que vem escrito em TODOS os manuais: que não se redijam respostas no livro de modo a que o mesmo possa ser reutilizado.
Peço desculpa pelo testamento.
Correção:
Eliminaré estranho que o cronista
Ora essa, não tem de pedir desculpa rigorosamente nenhuma. Gostei muito do seu comentário e do modo como o fundamentou.
EliminarRelativamente à questão que levanta, "não me parece que se questione tanto outras profissões", não sei se concordo consigo. Temos tendência a estar mais atentos ou sensíveis quando o assunto nos diz, por alguma forma, respeito e talvez esse seja o seu caso (não sei se está ligado à educação). Quando o assunto é a saúde, assisto a desabafos de médicos ou enfermeiros exactamente no mesmo sentido, que são sempre eles "os bombos da festa", que não se questionam da mesma forma outras profissões.
Quanto às diferenças de paginação, acredito que seja mais do que isso que leva um a escola a adotar um livro e a recusar outro. Também me parece que quando o cronista fala em "s'tores" não se está a referir aos professores em concreto, estará, pelo menos foi assim que interpretei, a falar de doutores ligados às cúpulas decisórias (quem determina os conteúdos programáticos e, como tal, condiciona a escolha que depois os professores de cada escola fazem). Quanto a falar sobre o que não sabe, penso que não é o caso da crónica em apreço. Desde o início ficou claro que aquilo foi o que se passou quando precisou de comprar os manuais para os seus filhos, não disse que era assim em todas as escolas ou com todos os livros. Sei que se vendem livros de exercícios à parte (aconteceu com a minha irmã, cujas filhas têm dois anos de diferença e que pôde aproveitar o manual principal para a mais nova, comprando apenas o das fichas), mas não sei se é assim em todas as editoras. O cronista disse que no caso dos livros dos seus filhos, a editora não vendia livros em separado, não generalizou. Da mesma forma que esclareceu que mesmo sendo escritos a lápis é difícil apagar alguns livros, portanto não ignorou a tal regra que refere.
Gosto muito do Dr. Mário Cordeiro, admiro-lhe as capacidades profissionais e a humanidade com que fala/escreve, a empatia que demonstra para com os outros (empatia como capacidade de se colocar na posição de outros, em inglês "to walk in someone else's shoes"). Aqui deixa bem claro que no seu caso a questão económica não tem o peso que terá noutras famílias, ele pode pagar aqueles valores mas outros não poderão. Mesmo baseado na experiência pessoal o cronista pôs-se no lugar de outros (e isso não é muito comum, leio muitas crónicas em que os autores apresentam o seu ponto de vista como único ponto de vista válido, na medida em que se baseia em factos/experiências reais, descurando que outros possam ter outras experiências e nem por isso menos válidas). Além da empatia gosto do despretensiosismo e simplicidade com que fala, do discurso claro adequado tanto aos menos letrados como a um cientista (uma atitude muito semelhante à de Rogério Alves nos seus comentários às questões jurídicas - como advogado poderia usar uma linguagem demasiadamente hermética só compreensível por outros juristas, mas consegue simplificar o discurso de modo a que não-juristas o percebam sem contudo perder o rigor científico).
Mas, lá está, o título do post denuncia-me, gosto mesmo muito do Dr. Mário Cordeiro, talvez por isso isso não consiga ver os "defeitos" que aponta à crónica.
Bom, aquilo de só mudar a página é claramente um exagero já que os manuais só se mudam se houver alterações programáticas (mas sim, nalguns casos poderão ser muito poucas)... À parte disso, eu concordo plenamente com o que diz. Deveria ser proibida a venda exclusiva de "packs"(manual+livro de exercícios) tal como é absurda (mas completamente absurda) a qualidade do papel e impressão, a quantidade de cores e o espaço desperdiçado com questões meramente estéticas.
ResponderEliminar(eh pah, um livro com poucas cores torna-se aborrecido - dependendo da idade, eu sei - há que estimular os miúdos, não?)
EliminarÉ exagero... Só para matemática do 10° ao 12° ano têm 6 (seis!) livros! Aquilo é caríssimo. A qualidade é brutal, há espaço perdurariamente desaproveitado... As editoras aproveitam-se, pois claro que se aproveitam...
EliminarSeis livros por ano, não sei se ficou claro...
EliminarSeis?! para uma só disciplina?!
EliminarMário Cordeiro a Ministro da educação, já!
Seis!
EliminarNão é bem um exagero, Nê. Atesto que é verdade, este ano aproveitei um livro de matemática, igualzinho em tudo erxcepto... na paginação.
EliminarO Lobby das editoras é vergonhoso. Subscrevo o artigo do Mário Cordeiro a 100%, mas eu sou suspeita, tenho um fraquinho grande por ele.
Yep. 5º e 6º ano têm três livros. A partir do 7º aumenta. É vergonhoso.
EliminarEu disse primeiro, Picante. Eu tenho um fortinho por ele. :DDDDD
Eliminarahahahahahahah
EliminarMas eu vejo-o amiúde. Hoje em dia pelo menos duas vezes ao ano. E é giro, ainda por cima.
:DDDD
Eliminar(e que se mantenham só dois "avistamentos" por ano, é sinal de que está tudo bem com a saúde dos Picantezinhos)
Pic, o que eu quis dizer é que a atribuição dos manuais só muda quando há alterações programáticas, sendo que só nessa altura os professores podem "exigir" um novo livro.
EliminarEm termos de dinheiro não foi uma fortuna, cerca de 60 euros, mas são 12 livros mais cadernos.
EliminarIsto no 2ª ano.
Perdão! Podes repetir?! 12 livros no 2.o Ano?!
EliminarQuantas disciplinas têm? A minha, no 1.o ano, tem português, matemática, estudo do meio, inglês, educação física, expressão plástica e educação musical, sendo que para estas três últimas não precisa de manual. 12 livros?!
EliminarInglês 3 livros + 1 caderno
EliminarMúsica - 1 caderno (julgo que tem um livro mas posso estar enganado)
Estudo do meio 2 livros + 1 caderno
português 2 livros + 1 caderno
matemática 2 livros + 1 caderno
1 caderno para diversos trabalhos
educação física, expressão plástica, patinagem e piscina felizmente não é necessário livros =)
Parece que me enganei em 3 (fazer contas de cabeça à pressa deu nisto, peço desculpa pelo engano, mas honestamente 9 parece-me demais), mas no fim de semana já confirmo melhor que é quando vem tudo para casa.
É uma mochila que vai cheia, é um exagero, mais a caderneta e folha de fichas que costuma trazer
e sem dúvida que é um grande negócio, a minha filha tem um livro de fichas mais o manual que só era necessário comprar o de fichas pois o outro está sempre intacto. mas não, todos os alunos do país têm comprarem o pack, como disse a AMP é um lobby.
EliminarPois, o material depende de escola para escola. Na da minha as principais disciplinas tênue manual e respectivo livro de exercícios, mas a professora não pediu cadernos, apenas um dossier, moças e papel. Os livros, por norma, ficam na escola e se for preciso fazer algum trabalho de casa vem uma ficha dentro da mica, nesse aspecto os miúdos não andam muito carregados.
EliminarMicas* e não mocas
EliminarUrso Misha só queria alertar em relação a ter que comprar o pacote isso acontece mais nas livrarias e não propriamente pela editora.
EliminarMandei vir todos os livros do meu filho pelo wook.pt e quando era para seleccionar os livros poderíamos mandar vir diversas quantidades de cada 1 (incluindo o zero), ou seja, não obrigavam a comprar tudo junto - creio que a excepção era o de Português.
@Mirone - durante a semana também só traz ou uma ficha ou o caderno ou um livro com TPC e para já ainda levamos a mala, mas parece tanto para crianças tão pequenas, que até me deixa um pouco triste. Fui contar meio à pressa ontem e o ano passado (1ºano) eram 9 livros também...
Eliminar@anónimo - como é a escola que trata disso, pensei que tivesse a ver com a região.
Este lobby das editoras é uma vergonha. Há anos q essa treta me enoja (e nem sequer compro livtos p putos (ainda )).
ResponderEliminarSim, passa-se o mesmo comigo. A minha filha foi este ano para o 1.º ano, não gastei sequer 50 euros, mas preocupo-me na mesma.
EliminarEu sou um pouco mais radical: sou contra o facto de termos que comprar livros.
ResponderEliminarA escola é obrigatória e (tendencialmente) gratuita. Está na nossa constituição mas não me parece que dar 300€ e pico por livros, fora o restante material seja "tendencialmente gratuito". Nem me parece normal que Portugal seja dos poucos países onde são os pais a pagar essa conta.
Quantos países na Europa têm o mesmo sistema que o nosso? E quantos dão todos os livros, gratuitamente, a todos os seus alunos?
E porque não se imita isso em Portugal? É que, na maioria dos países europeus os pais pagam a roupa e a mochila dos miudos, o resto (manuais, cadernos, lápis, canetas, etc) é tudo fornecido pelo Estado/escola.
Por acaso tive a sorte de ter calhado numa camara municipal que oferece os livros a todos os miúdos da primária, não que não possa pagar mas acho incrivelmente injusto pagar por algo que é uma das nossas obrigações e supostos direitos da constituição.
Mas enquanto os lobbys se vão mantendo quem fica sempre mal são os da classe média, que pagam tudo por inteiro e não têm direitos nenhuns.
O cumprimento da constituição no que se refere ao tendencialmente gratuito parece-me assegurado pela acção social escolar que comparticipa o pagamento de livros, refeições e transporte na medida da capacidade económica do agregado familiar (penso que são 3 os escalões de benefícios, não tenho a certeza).
Eliminarao ensino* tendencialmente gratuito
EliminarNão mirone, é aos 2 escalões mais baixos. Por exemplo, um casal onde entre os 2 ordenados mínimos nacionais já é 3º escalão e não tem direito a nada.
EliminarOra, esse dinheiro na familia faz muita falta/jeito e mesmo em pessoas que ganhem bem, para muitos o dinheiro continuaria a dar para outras experiências (p.ex. no caso do Dr. Mário Cordeiro os 1200€ podem não lhe fazer falta mas poderiam ser empregues a fazer outras coisas, a permitir experiências de aprendizagem e afins) - não que ele não os possa pagar apesar de dar esses 1200€ mas para muitos pais, darem os 1200€ (que até podem ter) pode impossibilitá-los de permitirem os seus filhos de tirarem uma outra formação à parte, de frequentar aulas especificas ou outros hobbies...
(Eu não tinha a certeza quanto aos escalões, obrigada pelo esclarecimento)
EliminarIsto que me diz vem no sentido da crónica transcrita, que subscrevo. Parte do valor que as famílias gastam em livros poderia ser usado noutras actividades se os mesmos fossem deitados pelo Estado e a preços controlados.
Quanto à gratuitidade do ensino, a ser como é proposto na crónica, Tal não colidiria com a política de apoio social escolar, que continuaria a ser usada. Não faço questão que os livros da minha filha tenham de ser gratuitos se eu os puder pagar. Prefiro até que os que realmente não podem pagar tenham livros grátis e outros os paguem do que pura a simplesmente todos deixem de pagar, os que não podem e os que podem. Num mundo ideal a saúde, a educação, a cultura, etc deveriam ser gratuitos mas não vivemos num mundo ideal e nem sempre a igualdade é sinônimo de justiça, antes passa pela equidade.
Concordo em certa medida mas não totalmente.
EliminarPor exemplo, há pessoas com baixos rendimentos que têm direito a livros gratuitos, almoços gratuitos, etc (e não sou contra que o tenham) mas, fazendo as contas, em algumas situações o que acontece é que as pessoas de uma determinada familia ao terem que pagar tudo (livros, senhas, deslocações) acabam por lhes sobrar menos do que à outra familia. Isto também não é equidade.
Acho que até um certo limite (que não o actual) deveriam ser dados. Pelo menos até garantir que uma familia que tenha que pagar tudo do próprio bolso não acaba por ter que sobreviver com menos do que uma que obtenha ajudas estaduais.
Mas sinceramente depois de ter estado na Suiça, para mim o sistema deles faz-me muito mais sentido. A educação é gratuita, todos a pagam através dos impostos mas nenhum é sobrecarregado.
Por outro lado, se os livros viessem do Estado acabava-se com os lobbys e os preços absurdos dos livros em 3 tempos (ou talvez não...).
Como disse acima, o ideal seria que os livros fossem fornecidos pelo estado, sem custos. Eu sei quemoutros países é isso que acontece, mas infelizmente falamos de países com uma saúde económica e financeira uns furos acima da nossa.
EliminarA questão dos escalões terá sempre espinhos. Por um euro se sobe de escalão e esse euro que determinado agregado tem a mais que outro vai implicar que tenha despesas de dezenas de euros. É injusto, sei que é, mas por muito que se alargue o intervalo dos escalões, haverá sempre alguém que ganha mais um euro ou dois.