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quinta-feira, 28 de setembro de 2017

Em loop no meu pensamento desde ontem


TU ME QUIERES BLANCA

Tú me quieres alba,
Me quieres de espumas,
Me quieres de nácar.
Que sea azucena
Sobre todas, casta.
De perfume tenue.
Corola cerrada

Ni un rayo de luna
Filtrado me haya.
Ni una margarita
Se diga mi hermana.
Tú me quieres nívea,
Tú me quieres blanca,
Tú me quieres alba.

Tú que hubiste todas
Las copas a mano,
De frutos y mieles
Los labios morados.
Tú que en el banquete
Cubierto de pámpanos
Dejaste las carnes
Festejando a Baco.
Tú que en los jardines
Negros del Engaño
Vestido de rojo
Corriste al Estrago.

Tú que el esqueleto
Conservas intacto
No sé todavía
Por cuáles milagros,
Me pretendes blanca
(Dios te lo perdone),
Me pretendes casta
(Dios te lo perdone),
¡Me pretendes alba!

Huye hacia los bosques,
Vete a la montaña;
Límpiate la boca;
Vive en las cabañas;
Toca con las manos
La tierra mojada;
Alimenta el cuerpo
Con raíz amarga;
Bebe de las rocas;
Duerme sobre escarcha;
Renueva tejidos
Con salitre y agua;
Habla con los pájaros
Y lévate al alba.
Y cuando las carnes
Te sean tornadas,
Y cuando hayas puesto
En ellas el alma
Que por las alcobas
Se quedó enredada,
Entonces, buen hombre,
Preténdeme blanca,
Preténdeme nívea,
Preténdeme casta.


Poema de Alfonsina Storni, a mulher que escrevia "como um homem", quando das mulheres se esperava apenas que escrevessem como mulheres.

quarta-feira, 27 de setembro de 2017

Será que ainda vou a tempo de mudar de concelho?

Aproveitei a ausência de Mr. Mirone e o convite que a Mironinho teve para jantar em casa dos avós para me sentar e ler com atenção os panfletos que os candidatos à minha autarquia têm depositado na minha caixa de correio.

terça-feira, 26 de setembro de 2017

Luz dos meus dias que me dás senão alegrias

-Mamã, lembras-te da última vez que viemos aqui e estava a haver um desfile de bicicletas pasteleiras?
-Lembro! E tu, ainda te lembras porque é que lhes chamavam pasteleiras?
-É porque eram suuuuper pesaaaaaadas e por isso as pessoas iam a pastelar. Assim como se eu tivesse de te arrastar.


Glup...

sexta-feira, 22 de setembro de 2017

Ontem havia um indigente a gritar à porta do snack-bar onde almocei

 Chegava todas as tardes depois do almoço e sentava-se sempre no mesmo lugar, junto à janela, pedia um carioca de limão, lia o jornal, fazia as palavras cruzadas e quando acabava perguntava se já era hora de fechar. "Ainda falta, senhor Santos, pode ficar, até às seis servimos sempre". Então, levantava-se e aproximava-se do balcão, procurava nos bolsos meia dúzia de moedas escuras para pagar e começava. "Chama-se Margarida, é assim? Sabe que namorei uma Margarida quando tinha dezasseis, dezassete anos? Conheci-a ainda não tinha treze anos e soube logo ali que um dia havia de a namorar. Era linda, uma estampa!". Margarida sorria e deixava-o contar a estória de sempre, que ela já sabia de cor, de como apesar de ser um jovem garboso demorou três anos a conquistar a menina mais bonita de Teixeira Pinto, de como os namoros de então eram muito diferentes do que são agora. Às vezes Margarida aborrecia-se, via o serviço a acumular-se, sentia vontade de lhe acabar as frases para encurtar o relato, mas sabendo que ele não tinha mais ninguém com quem conversar, esforçava-se para que ele não se apercebesse do tédio que a mesma estória contada vezes sem conta causava nela e ouvia-o até ao fim.
Margarida também fingia que não sabia que ele passava fome em casa quando insistia para que comesse qualquer coisa antes de sair. "Sabe bem que depois das cinco oferecemos os bolos e sandes que não se venderam, senhor Santos. Faça-me a vontade, leve esta sandes. E também sobrou sopa, vou guardá-la numa caixinha para levar. Se não quiser dê a alguém que precise".
Há uns meses Margarida teve a ousadia de lhe sugerir um serviço da paróquia que tratava das roupas de quem precisava mais. Ele ofendeu-se, tratou-a mal, chamou-lhe garota, quem era ela para insinuar que precisava de recorrer à caridade alheia, que já teve na vida mais dinheiro do que ela alguma vez poderá imaginar e saiu a gritar que nunca na vida tinha sido tão insultado. Surpreendentemente, continuou a aparecer todos os dias à mesma hora, sujo e roto, falava alto, cuspia no chão, incomodava os outros clientes, a quem Margarida pedia encarecidas desculpas, tentando encontrar desculpas para o indesculpável, continuando a oferecer-lhe sopa para levar para casa, até ao dia em que se cansou do velho pérfido e sujo em que se tornou o pobre diabo de quem um dia teve pena e lhe vedou a entrada, afinal de contas Margarida sabe bem que aquela miséria não se combate com sopas.



terça-feira, 19 de setembro de 2017

Sensibilidade e bom senso

Dou por mim a refletir sobre a físico-química cerebral da sociedade que, do ponto de vista das artes -veja-se a pintura, escultura, música - revelavam uma sensibilidade ímpar, mas que admitia comportamentos que hoje classificamos como desumanos.

Como um código secreto

- Mamã, porque é que os pronomes são pessoais?
- Porque se referem a pessoas...
- Ah, está bem. Pensei que fossem privados ou assim.
- Assim como?
- Como o código secreto dos cartões. É um código pessoal, não é?

segunda-feira, 18 de setembro de 2017

Parece impossível!

Então não é que os filhos da Madonna pisaram a relva de Seteais?! E com os avisos ali à vista de todos!



quinta-feira, 14 de setembro de 2017

Da espera, do esperado e da esperança




Esfregou as mãos vigorosamente e estalou os dedos que, poucos segundos depois, traçariam o destino de dois homens, um deles bom. Passados tantos anos duas palavras bastariam para que o outro tombasse e não mais se erguesse, assim o decidisse: Liminarmente indeferido!
***
Porfírio Manuel da Cunha Lencastre e Silva de Almeida Gonçalves Azeredo Mascaranhas descendia de uma família tradicional de proprietários abastados do interior do país, cuja fortuna porém, em tempos incalculável, se dissipava a cada geração, por força de sucessivas partilhas por fratrias numerosas.
Quando a altura chegou, sem surpresa e como era esperado e costume na sua família, por ser o terceiro filho varão, Porfírio Manuel da Cunha Lencastre e Silva de Almeida Gonçalves Azeredo Mascaranhas foi enviado para o seminário de Viseu. Levou consigo apenas as roupas constantes da espartana lista de enxoval, obrigatoriamente identificadas com as iniciais do seu nome, que não estranhou, em sua casa as roupas eram marcadas com as iniciais do nome de cada filho para que se não confundissem na hora de as distribuir pelos respetivos armários, e um retrato da mãe, que guardava com devoção debaixo do colchão e que beijava todas as noites antes de adormecer lavado em lágrimas de saudade, motivo de chacota pelos colegas mais velhos. Ah, como invejava a sorte dos irmãos, os dois mais velhos na boémia de Coimbra, para onde foram mandados para estudar, como era suposto, um, medicina, o outro, direito, bem como das irmãzinhas mais novas que agora recebiam em exclusivo os carinhos e afagos da Mãe. Aceitou, resignado, a decisão dos Pai, era assim que tinha de ser e Porfírio Manuel da Cunha Lencastre e Silva de Almeida Gonçalves Azeredo Mascaranhas tinha sido educado, desde muito cedo, que de um homem bom se esperava que fizesse o que tinha de ser feito, mesmo que sem vontade, e na sua família o terceiro filho seria Bispo, como era o tio e tinha sido o tio-avô. Poucos dias passaram para que no seminário todos os tratassem por Chorão. A Porfírio Manuel da Cunha Lencastre e Silva de Almeida Gonçalves Azeredo Mascaranhas revoltavam-se as entranhas de cada vez que o zombeteiro-mor, anémico e com voz de pífaro, protegido do Reitor, o chamava pela alcunha.  
- Mil vezes Chorão a PALERMA! Sim, PALERMA! Faças o que fizeres nunca passarás de um grandessíssimo PALERMA, Pompeu Athayde Lacerda Espinosa Reboredo Menezes d'Almeida. PALERMA! PALERMA! PALERMA Mil vezes PALERMA, tantas quanto o monograma que trazes nas roupas mostram! – gritou enquanto desferia com todas as suas forças uma saraivada de murros no rosto pálido e magro de Pompeu Athayde Lacerda Espinosa Reboredo Menezes d'Almeida.
Na manhã seguinte, bem cedo, o Pai chegaria ao seminário para o levar para Ílhavo, a casa de um seu amigo de infância, guarda livros na Fábrica de Louça que, sabendo do quid pro quo no Seminário, assim lhe chamou, imediatamente manifestou interesse em formar o jovem Porfírio Manuel da Cunha Lencastre e Silva de Almeida Gonçalves Azeredo Mascaranhas nas artes do diário, razão e balancete. Soube mais tarde, pelo irmão, que Pompeu Athayde Lacerda Espinosa Reboredo Menezes d'Almeida, acabaria também ele por abandonar o Seminário meses depois, por motivos que nunca foram tornados públicos,  vindo a formar-se em medicina, ortopedia, se a memória o não enganava.
Porfírio Manuel da Cunha Lencastre e Silva de Almeida Gonçalves Azeredo Mascaranhas estudou de noite, trabalhou de dia, e quando completou o curso comercial concorreu a uma vaga na repartição de Finanças de Aveiro e por lá fez toda a sua carreira, deixando para trás aquele triste episódio que manteve em segredo. Acompanhou-o toda a vida, porém, a profunda aversão a monogramas, anagramas, siglas e acrónimos. Por isso, guardando máximo sigilo quanto às suas motivações, permitindo-se uma vez na vida fazer algo que não o esperado, fazia questão de mandar bordar o nome completo no interior de todos os seus casacos.
***
Largou o telefone, fechou os olhos, comprimiu os ossos do nariz com força e suspirou pesadamente. Conhecedor dos cada vez mais frequentes acessos de fúria de Catarina Constança de Abigaíl e Melo Vasconcelos de Paes Gouveia Albuquerque, injustificados, é bom de ver, que Porfírio Manuel da Cunha Lencastre e Silva de Almeida Gonçalves Azeredo Mascaranhas era um homem bom e como um bom chefe de família habituado a fazer o que deve ser feito, permitira que a mulher ficasse, despreocupada, em casa a tomar conta das crianças e das minudências do lar, poupando-a aos horários rígidos e responsabilidades de quem trabalha por conta de outrem, dedicando o seu tempo livre às artes finas da agulha, como era espectável que uma senhora de bem se dedicasse e, procurando em cima a mesa  serviço que lhe permitisse adiar o regresso a casa o mais que pudesse, pousou primeiro  os olhos e depois a mão no envelope azul.
Abriu-o devagar e releu o requerimento manuscrito cuja caligrafia lhe era vagamente familiar:
                       Exm.º Senhor Chefe da Repartição de Finanças
Pompeu Athayde Lacerda Espinosa Reboredo Menezes d'Almeida vem mui respeitosamente requerer…
Tirou a caneta que guardava no bolso interior do casaco, leu o seu nome bordado a linha de seda cor de sangue por Catarina Constança de Abigaíl e Melo Vasconcelos de Paes Gouveia Albuquerque, Porfírio Manuel da Cunha Lencastre e Silva de Almeida Gonçalves Azeredo Mascaranhas, e sem hesitar escreveu com pulso firme e seguro o despacho que tinha de ser proferido.
Solicita-se autorização superior
E assinou
Porfírio Manuel da Cunha Lencastre e Silva de Almeida Gonçalves Azeredo Mascaranhas.

quarta-feira, 13 de setembro de 2017

Felizes os que acreditam

- Ai, mamã, estou tão ansiosa por sexta-feira!
- Então?
- O professor de música vai dar a nova lista do coro. Achas que este ano vou ter vaga?

segunda-feira, 11 de setembro de 2017

Da consciência da finitude e dos nomes bordados no interior dos casacos

A pele curtida do sol dava-lha mais 20 anos do que aqueles que realmente tinha e a camisa coçada do sol colada ao corpo seco, ossudo e suado deixava adivinhar a corcunda precoce de quem desde os 10 anos carregava sobre os ombros frágeis o peso do mundo, primeiro a puxar, com os bois, as redes de pesca, depois tijolo de burro e baldes de areia, quando construíram a lota nova. Quando fez dezasseis anos fartou-se do mar e emigrou. Ficou pouco tempo, a França não era para ele, tinha fome, frio, lembrava-se que na praia nunca lhe faltou o que comer e o cunhado dizia-lhe que quando abrissem a estrada nova iam precisar de madeireiros. Depois de trinta e cinco anos a cortar pinheiros e a desmatar, os médicos disseram-lhe que a coluna não aguentaria muito mais tempo, que depois de operado teria de mudar de vida, reformaram-no e ele passou a limpar uns terrenos, "para a morte não vir tão depressa". "Ó engenheiro, não tinha de cá vir de propósito, pagava depois. Então, o que me diz? O sacana deu luta mas veio abaixo, não foi mais teimoso que eu. Tem aqui lenha para meia dúzia de invernos". Dobrou o cheque sem o ler e guardou-o no bolso da camisa, "Carago, anda um gajo a matar-se uma vida para comprar um fato, que é a única coisa c'a gente leva" 


sexta-feira, 8 de setembro de 2017

quinta-feira, 7 de setembro de 2017

Porque me arrogo o direito de

em período de férias ter a minha própria agenda, e não a que me impõem,  de não querer discutir nos blogs o sexo dos anjos, que nem neutro é, pois que não o têm, ou os incêndios, ainda menos com pessoas que do assunto percebem tanto quanto eu de um lagar de azeite, ou os gémeos do Cristiano, de me sentir frustrada quando numa reunião com um nosso governante percebo que por apoio à industria exportadora se entende formas de financiamento (e recurso a crédito), de supor que a Indústria 4.0 não passa um nome pomposo num país onde basta olhar para os cartazes das candidaturas às nossas autarquias para perceber que não há fosso entre o litoral e o interior, que é tudo uma miséria pegada e, acima de tudo, o direito de querer ver esclarecida a minha dúvida sobre nomes bordados no interior dos casacos e de fazer dos blogs o uso que bem entender...

... para gáudio dos meus anónimos, deixo aqui a minha herege consagração a Pipoco Mais Salgado, na esperança de que, mais de uma semana volvida sobre a publicação do post, alguma alma caridosa me esclareça as dúvidas sobre aquilo dos casacos bordados. 

Ó Senhor meu, ó meu Senhor

Eu me ofereço toda a Vós
E, em prova da minha devoção para convosco,
Vos consagro, neste dia,
E  para sempre,
os  meus olhos, meu ouvidos,
minha boca, meu coração e,
inteiramente, todo o meu ser:
e por assim sou vossa,
Ó incomparável Pipoco,
Guardai-me, defendei-me
Como coisa e propriedade vossa.
Lembrai-vos que vos pertenço,
Terno Pipoco, Senhor nosso;
Guardai-me e defendei-me
Como coisa própria vossa
 
Salvé, Pipoco, Blogger de misericórdia, 

vida, doçura, esperança nossa, salve! 
A Vós bradamos, os degredados filhos da bloga. 
A Vós suspiramos, gemendo e chorando neste vale de lágrimas. 
Ei-lo, pois, advogado nosso, esses Vossos olhos misericordiosos a nós volvei. E, depois deste desterro, nos mostrai a luz, benditos ensinamentos de Vosso blog. 
Ó clemente, ó piedoso, ó Mais Salgado Pipoco. 
Rogai por nós, Senhor Pipoco, para que sejamos dignos das Vossas promessas.

Amen.

Da neutralidade...

Era uma vez uma corrente de supermercados tão neutra, tão neutra, tão neutra, que nas embalagens de  produtos gregos em que era usada uma fotografia de Santorini decidiu apagar as cruzes na cúpula da Imerovigly Anastasi, uma igreja ortodoxa, para não ferir susceptibilidades.